Binômio: jornalismo e história


26.09.2018

Para os 90 anos de José Maria Rabelo

 No começo era apenas uma brincadeira entre estudantes que a polícia resolveu levar a sério. Eles também. Cansados de viver de sombra e água fresca, começaram a fazer jornalismo e história na arcaica Belo Horizonte dos venturosos anos 50, divisada entre juscelinos, bias-fortes, lucianos e tantos outros. O jornalismo vinha das fileiras históricas de Campos Gerais, no Sul de Minas, na figura genial de José Maria Rabêlo. A história vinha das frondosas árvores da Zona da Mata, da musical Ubá, na figura generosa de Euro Arantes, que a partir dos linotipos móveis de Gutenberg criaram uma terceira arte, apelidada de imprensa alternativa, que depois emprestaria sua fórmula e seu caminho para O Pasquim, o jornal Opinião, Movimento, entre tantos outros.

Já no primeiro número do jornal, saído no domingo do dia 17 de fevereiro de 1952 - composto manualmente e rodado em papel de péssima qualidade, com quatro páginas tabloides - selou-se um caso de amor incondicional entre a capital mineira e o semanário jornal. Era amor verdadeiro, nutrido pelos editoriais inspirados de José Maria Rabêlo e Euro Arantes, pelas matérias de Roberto Drummond e Ponce de Leon, pelas fotos de Antônio Cocenza, pelas charges de Ziraldo, Raf, Borjalo, pelas colunas do General da Banda e General Legal, pela diagramação de Oséas de Carvalho, entre tantas estrelas que começavam a brilhar ali, como José Aparecido de Oliveira, Alberico Souza Cruz, Orlando Vaz Filho, Fernando Gabeira, Paulo Mendes Campos, Afonso Romano Sant'Anna, Cyro Siqueira, Fábio Lucas, Mauro Santayanna, entre tantos outros nomes, em doze anos de jornalismo e escola.

Pioneiro, destemido, debochado, ousado, irônico, criativo, cívico, irreverente, contundente, heróico, inovador e genial, loucamente genial... profundamente genial... que saudade... que saudade... Assim foi o Binômio, uma perfeita interação entre o jornalismo, o jornalista e o seu tempo.

Como era um caso de amor verdadeiro entre a cidade e o jornal, e isso havia virado Minas de cabeça para baixo, ele teria que ser interrompido pelos medíocres, por aqueles que não entendem que a história se faz a partir dos sonhos dos homens. Após o dia 30 de março de 1964, depois de vários punaros-bleys, a ditadura caduca impediu a circulação do Binômio e passou a perseguir àqueles que o faziam. José Maria exilou-se mundo afora. Euro assistia a tudo, indignado, lá do céu.

A minha revolta é que não ouvi falar do Binômio durante os meus quatro anos de faculdade de jornalismo. Um profundo desrespeito com o jornalismo, com a história do jornalismo, com a história da cidade de Belo Horizonte e, principalmente, com aquele que recorre a uma faculdade para aprender um pouco sobre as coisas deste mundo e do seu tempo. Aprendi que a nossa história se faz mais nas ruas que nas bancadas das universidades. Pena!

Agora, depois de ler nas páginas do tempo as glórias do Binômio, sigo por aí afora anunciando a boa nova que nunca se perdeu de nós. Sigo como o velho menino jornaleiro apregoando aqui, ali e acolá a grande 'velhice que chegou'.

Petrônio Souza Gonçalves

Petrônio Souza Gonçalves é jornalista e escritor

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