Temperos mineiros


16.05.2018

Chego ao pé da ladeira: no alto, a Igreja Matriz impera com sua beleza. De longe se vê o olhar de Nossa Senhora da Conceição, padroeira do Serro, nossa sempre Vila do Príncipe. Subo brincando de pular pedrinhas. Tão unidas em harmonia, como uma Irmandade. Lembro-me de Ana D'África. Apaixonada como eu pelo Serro, por cada pedra encaixada sobre a outra, em muros como o que cerca a Matriz. Calçamento delicado, uma arte sensível, feita por mãos maltratadas e corroídas pelo trabalho escravo. Mal sabíamos que era a forma de os escravos expressarem a sua arte.

Acho que cantarolavam... cânticos da sua terra em pensamento. Saudade é a palavra que nos move. Imagino o olhar, uma vez na escolha das pedras pequenas, ora outra nos transeuntes... nobreza à parte na nossa história.

A noite fria os aguardava, sofria junto a eles, nossa donzela guerreira Ana D'África, que recebeu este nome depois da sua condenação de morte na forca. Mas, por compaixão de Dom Pedro I trocou sua sentença pelo exílio na África. Nascida a caçula Ana Siqueira, filha do Alferes Ângelo Martins de Siqueira, seu nome lhe foi tirado por assumir o lugar de um escravo no assassinato do cruel marido e primo, José Carlos Siqueira, assinando assim a sua ausência na história da Vila do Príncipe. Ela sofria do mal que corrói a alma, a saudade da sua terra, das suas igrejas, pedras, família e Irmandade.

Sigo em direção à praça João Pinheiro. Um beco chama a atenção. Pedrinhas redondas são o tapete que nos convida a passar por um atalho de acesso a escadaria de Santa Rita. Subo pelos degraus espaçosos com pedras a preencher, como este espaço sempre vazio dentro de mim, deve ser o pedaço que fica quando se vai embora da sua terra natal.

Ah! A subida vale a pena... olha esse por do sol!!! Vejo pelos olhos da Ana. Que saudade ela sentia do que ainda não havia vivido: A distância. Preço pago pelas palavras que um dia ousou profetizar: “Eu nasci para ser livre... Essas montanhas me sufocam. Gostaria de ser um pássaro, conhecer outros lugares, Um dia conhecer o mar...” Ana D'África, 1822

Receita de hoje: Mamão verde com costela de boi:

  • 3 kg de costelas de boi limpas e cortadas em pedaços, temperadas com alho socado, louro e sal;
  • 2 mamões verdes picados quadradinhos;

Em uma panela de alumínio batido ou grossa, coloque duas colheres de óleo e sele a costela, tampar e deixar soar.

Colocando água quente aos poucos, ate cozinhar, carne soltando do osso.

Deixe esfriar e retire toda a gordura, que altera o sabor.

Em uma panela maior, refogue um pouco de alho em urucum, acrescente o mamão picado.

Coloque a carne, pingue um pouco de água quente e deixe cozinhar por 10 minutos.

Acompanha angu de fubá de moinha d'água.

Livro - Ana D'África
Maria Sylvia Salles Coelho

Chef Eloísa Cardoso

Eloísa Cardoso - Chef de cozinha, resgate da tradicional culinária mineira, Membro da FGM (Frente Gastronomia Mineira)

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